Você é um turista ou um viajante?
Em uma das oficinas* de escritas de viagem que participo, me
deparei com um texto do livro Crônicas de Viagem, de Cecília Meireles,
intitulado "Roma, turistas e viajantes". Nele, a autora apresenta algumas características
que diferenciam o turista do viajante, em um percurso pela capital da Itália. É
claro que, além de pensar essas diferenças, várias lembranças da minha visita a
Roma vieram à tona.
Enquanto o turista é caracterizado por Cecília como aquela
figura que caminha pelo mundo, passando de um lugar a outro “sem apego nem compromisso”, “olhando o que lhe apontam, comprando o que
lhe agrada, expedindo muitos postais (...)”, fotografando as paisagens e
sentindo-se feliz em levar as lembranças na câmera ou no papel... o viajante é
aquele “(...) de movimentos mais
vagarosos, todo enredado em afetos, querendo morar em cada coisa, descer à
origem de tudo, amar loucamente cada aspecto do caminho (...)”, que se
perde nos detalhes de cada lugar, com olhos lentos que deslizam pelas
minúcias... No decorrer do tempo que o turista leva para conhecer uma cidade, o
viajante conhece apenas uma rua, contempla parte de uma paisagem.
Enquanto eu lia sobre esses dois atores, comecei a pensar em como eu me movimento nas minhas
viagens. Qual deles sou eu? Qual deles você é?
Difícil ser apenas um o tempo todo. Por vezes, sou turista,
com uma curiosidade que me move a buscar sempre mais, ir adiante, conhecer o
que há depois... Quero tirar fotos, comprar souvenirs,
caminhar, conhecer, caminhar mais e conhecer mais...
Quando eu estava em Roma, lembro do dia em que percorria praças, monumentos e fontes na cidade... Na ansiedade em descobrir a
próxima paisagem, sem me apegar a detalhes, apenas registrando cada local em
fotografias, passei pela Piazza della Repubblica, del Popolo, di Spagna,
Fontana di Trevi, Pantheon, Piazza Navona, Campo di Fiori... Somente deixando
o vento me levar.
E entre um passo e outro, algo chama a minha atenção...
Então, paro e, tomada pela emoção e encantamento, me transformo em viajante. Quero
ficar ali, apreciando os detalhes, percebendo as sensações, revivendo as
lembranças que vêm à mente a partir daquele olhar, daquela cena que eu fotografo, dessa vez, apenas na memória.
Nesse mesmo dia, eu me peguei, à noite, sentada em um banco,
em frente ao Coliseu, envolvida em sensações... Enquanto meus companheiros de
viagem terminavam de eternizar aquele momento em diversas imagens capturadas
por suas câmeras, lá estava eu – apreciando o que restou daquele monumento,
tentando reconstruir cada detalhe que já não estava mais ali...
E nesse processo de reconstrução que eu arriscava arquitetar
em meus pensamentos, fui invadida pelas lembranças do dia anterior, quando,
sentada no interior daquele mesmo lugar, eu imaginava como eram travadas as
batalhas ali dentro e tentava, pela primeira vez, recolocar cada ruína decorrente
dos efeitos de terremotos, bombardeios e outras ações em seu devido lugar...
Esse era, também, o dia em que eu completava 30 anos e os
pensamentos sobre a vida invadiam a minha mente... o que tinha vivido até
aquele momento, o que ainda gostaria de realizar... Reflexões que se misturavam
às sensações que o lugar e a ocasião despertavam.
Voltando a minha atenção àquele cenário, observando a
construção iluminada pelo tom amarelo das luzes em cada abertura, que traziam a
sensação de aconchego... Ao mesmo tempo em que eu era invadida pela gratidão em
estar ali.... Emaranhada em sentimentos e sensações que foram quebrados por um: - Vamos lá, Luisa! – era o restante do pessoal chamando para ir embora. E fui,
acompanhando-os, mas com o coração querendo ficar...
E, hoje, eu percebo que deixei por lá um pedaço do meu coração... Um lugar que me transportou a um outro tempo, que me fez
parar, sentir, que despertou diferentes emoções... onde experimentei aflorar a
alma e o olhar de viajante.
Em uma mesma viagem, em um mesmo lugar... Eu fui viajante.
Mas, também, fui turista. Não há como ser um só... Cada lugar, cada momento, cada
experiência, cada sensação vai dando o tom para a viagem e vai nos fazendo
transitar por aí, ora como turista, ora viajante.
E você, percebe esse movimento entre turista e viajante
em suas viagens?
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